Stephen Michael King encontra leitores: "o desenho é minha primeira linguagem"
13 de Novembro de 2018 às 16:16
Originalmente publicado no Blog da Brinque

De onde vêm as ideias
Ele contou, por exemplo, que inspira-se muito em suas experiências e em sua vida: é do cotidiano e das relações que surgem as ideias para suas obras, das quais 16 estão publicadas por aqui. O livro Vira-Lata, premiado pela FNLIJ (Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil), é uma história real, disse ele. Sua irmã trabalhava em um abrigo para pessoas em situação de rua. Certa vez, apareceu por lá um cachorro vira-lata sem dono. Ele foi alimentado, mas não podia ficar, pois não havia comida suficiente para um morador extra. Mesmo assim, foi ficando, pois resistia a sair e sempre voltava. Até que a irmã de Stephen resolveu levar o cachorro para ele: "acho que vocês vão se dar bem, pois têm uma personalidade parecida", disse a irmã. Essa parte do relato arrancou risos da plateia."Estou aqui me apresentando a vocês como um artista, mas, no fundo, eu sou um pouco como um cão vira-lata"
Pedro e Tina é uma metáfora da relação do autor com sua mulher, Trish, a quem conheceu há mais de 20 anos, e que tem papel fundamental em sua obra. Ele contou que Pedro é ninguém menos que ele mesmo: sonhador, artista, colorido e fora dos padrões. Já Trish -ou Tina- tem um perfil mais organizado e prático. É ela, por exemplo, quem lê seus novos projetos antes que eles sejam apresentados ao mundo. [caption id="attachment_5394" align="aligncenter" width="415"]
"Quando encontrei Trish, soube que finalmente poderia ser quem eu era"
Durante a conversa, foram muitos os momentos emocionantes. Stephen compartilha seus sentimentos com naturalidade e com a simplicidade e a alegria de uma criança. Não gosta de falar de si, mas não parece sentir-se desconfortável em responder perguntas sobre sua vida e em expor o coração por trás da obra. Ao ouvi-lo falar, seu trabalho -tão poético e profundo- faz ainda mais sentido.Folha
Num certo momento da tarde, uma leitora, psicóloga, contou que usa os livros dele para ajudar as crianças a falarem de sentimentos. Dizendo que a obra dele tem curado pessoas sem ele saber, agradeceu. O relato dela emocionou a todos e deixou o autor com a voz embargada. Quando ele finalmente conseguiu falar, contou que o desenho também curou a ele. Stephen então retomou sua trajetória de vida --que, segundo ele revelou, está contada metaforicamente em seu livro Folha, o preferido dele--, lembrando que a surdez da infância, que durou sem tratamento adequado até 14 anos, foi um trauma em parte superado pelo desenho: "desenhar me fez atravessar esse período escolar". [caption id="attachment_5395" align="aligncenter" width="415"]
"Desenho é a minha primeira linguagem"
"Se não fosse por isso, talvez eu nunca tivesse me descoberto, poderia ter perdido esse meu caminho", disse ele, emocionado. O menino que desenhava e se comunicava desenhando logo percebeu que a linguagem restaura. Um de seus livros mais amados, o premiado O homem que amava caixas, foi uma dessas experiências de restauração. Na Livraria NoveSete, onde aconteceu o primeiro encontro do dia, às 10h, muito à vontade e também muito tocado, Stephen contou que a obra é sobre ele e seu pai.O homem que amava caixas
Analfabeto até perto dos 20 anos, o pai de Stephen era a pessoa que lia para ele todas as noites. Que o encantou pelo universo da literatura. Mas a relação deles também era árida. Nem sempre o pai demonstrava afeto do jeito como Stephen imaginava. Quando conheceu Trish, cujo pai morreu quando ela ainda era criança, a então namorada chamou a atenção dele para uma relação que, embora não fosse perfeita, existia: o pai estava vivo! Stephen conta que, refletindo, notou que o pai sempre estivera presente, a seu modo, em todos os momentos em que o filho precisou. Desse olhar, nasceu o livro. [caption id="attachment_2627" align="aligncenter" width="415"]
"Vocês abraçam bastante, o que é ótimo, porque adoro abraços"
Este texto foi publicado originalmente no Blog da Brinque e estava hospedado no site da Brinque-Book. A editora Brinque-Book foi integrada ao Grupo Companhia das Letras em outubro de 2020 e a migração deste conteúdo para dentro do Blog da Letrinhas tem como objetivo somar conhecimentos, unificar os blogs e fortalecer a produção de conteúdo sobre literatura infantil, leitura e formação de leitores.