"Super-Ulisses", de Caio Tozzi: aventura para formar leitores pré-adolescentes
Uma estante com nada menos que 244 livros. Que vai viajar por aí a bordo da caminhonete Super-Ulisses, ao lado de Albertina, uma super-leitora, e de Molina, que ainda vai descobrir o prazer de viajar nas páginas de uma boa história. Imagem: Super-Ulisses, de Caio Tozzi (texto) e Renato Drigues (ilustrações)
Livros para pré-adolescentes: ouvir os leitores
Esta é uma obra que foi inspirada na experiência real de Caio Tozzi com os livros -como roteirista de um programa que investigava bibliotecas e seu impacto em sua comunidade e também em suas viagens para conhecer escolas pelo interior. Assim surgiu Albertina e esse romance -indicado a partir de 9 anos-, que traz os livros como tema principal. Um livro para pré-adolescentes com um enredo poderoso: os livros são transformadores e merecem estar por aí, de mão em mão, para todos e todas. Essa obra de Caio Tozzi é uma deliciosa metáfora sobre o poder transformador da literatura. Mas os jovens leem? Diz Caio:---"
As ficções são parte constituinte da nossa existência. O poeta Ferreira Gullar sempre dizia a seguinte frase: 'a arte existe porque a vida não basta'. A gente não explica tudo pela realidade. Por isso, precisamos nos aproximar das histórias.
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Para ele, o leitor pré-adolescente e jovem --ao contrário do que muitos pensam-- gosta de ler e, por vezes, têm uma relação bem próxima e apaixonada com livros e escritores preferidos. Não à toa, lembra, nas pesquisas brasileiras sobre leitura, essa é geralmente a faixa etária que mais lê. Claro que há a leitura na escola nessa faixa etária, que puxa para cima esses números. Mas, mesmo assim, defende Caio, o jovem é leitor. A questão é deixar esse jovem fazer suas escolhas sem julgar tanto. Nós, adultos, costumamos criticar e querer que nossos filhos e alunos leiam o que consideramos bom. "Será que é esse o caminho?", Caio pergunta. Para ele, é preciso ter escuta para as preferências desse leitor e dialogar com ela. "A partir do que apresentem como interesse, traga outros títulos na mesma linha. Se é sobre um gênero -por exemplo, humor-, apresente crônicas engraçadas. Se é sobre um tema -por exemplo, futebol-, explore os livros neste universo".Os livros para pré-adolescentes precisam chegar até eles dialogando com seus gostos por gêneros e temas. Imagem: Super-Ulisses, de Caio Tozzi (texto) e Renato Drigues (ilustrações)
"O jovem leitor precisa saber que pode confiar nos livros"
Conversamos com Caio Tozzi sobre Super-Ulisses, suas personagens e os livros para pré-adolescentes. A seguir, você lê os principais trechos dessa conversa: Blog da Binque: Você criou uma história com personagens que têm relações muitos diferentes com os livros: a Albertina, o Molina, o Jonas, o Zezo. Por quê? Caio Tozzi: Este foi um cuidado [ao criar essa história]: trazer as diversas relações das pessoas com os livros. Independentemente das oportunidades que uma pessoa teve em sua trajetória, os livros são para [todos e todas], para ela também. Sempre é possível haver a aproximação, a descoberta. ---"A arte transforma, abre diálogos que às vezes não se consegue ter em nenhum outro ambiente. Imagina quanto ela pode ser poderosa no momento em que estamos crescendo, saindo da infância, entrando na adolescência, com tantas dúvidas, questões, com o desejo de pertencer ao mundo
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Por isso, cada uma [dessas personagens] tem um tipo de conexão [com livros]: a Albertina, uma grande apaixonada; o Zezo, que estimula a leitura para os outros; o Molina, que observa interessado, de longe, mas não sabe chegar nas obras; o Jonas, que não foi estimulado a ler e não percebe que pode ter uma história com a qual possa se encantar. BB: Essa diversidade você observou em sua trajetória de escritor? Caio: Isso veio a partir da observação e da convivência com esses diversos perfis, sempre na busca de abrir um diálogo com eles, entendendo e respeitando suas trajetórias. Era importante olhar para todos e afirmar, nesta história, que todos podem fazer parte e ter suas próprias relações com a literatura. BB: Os livros são personagens do seu livro também. Atravessam e transformam a vida das pessoas, mesmo de quem não os lê diretamente, como a avó do Zezo ou o próprio Molina do começo da história. É uma mensagem forte e poderosa essa. Por que falar disso com o jovem leitor? Caio: O pensamento que me guia é que a arte transforma, a arte abre diálogos que às vezes não se consegue ter em nenhum outro ambiente. Então, imagina quanto ela pode ser poderosa no momento em que estamos crescendo, saindo da infância, entrando na adolescência, com tantas dúvidas, questões, com o desejo de pertencer ao mundo. E eu acho que o jovem leitor precisa saber disso, precisa saber que pode confiar no livro (ou em qualquer outra obra artística) como um grande companheiro de jornada. Por isso, trazer essa temática em Super-Ulisses. BB: Você acha que os jovens leitores ainda se permitem transformar pelos livros? Caio: Acredito que sim, sem dúvida. As ficções são parte constituinte da nossa existência. O poeta Ferreira Gullar sempre dizia a seguinte frase: “a arte existe porque a vida não basta”. A gente não explica tudo pela realidade. Por isso precisamos nos aproximar das histórias. Isso desde que somos bebês até a nossa morte. E não seria diferente com os jovens - ninguém passa ileso por uma boa história. É verdade que hoje em dia (mas isso sempre aconteceu, não?) existem tantas outras formas de se consumir histórias - TV, cinema, games, qaudrinhos - que, dizem, tiram atenção do livro. É um olhar... Eu acho que pode ser o contrário: tudo pode convergir e fazer com que o jovem seja um grande “leitor” de tudo, do mundo, da vida. Afinal, quando falamos em ler, não estamos pensando unicamente em ler livros, mas ler o mundo, eu acho. BB: É comum ouvirmos que crianças e jovens não gostam de ler. Você discorda disso. Por quê? Caio: Ainda que seja num país como o nosso, com as questões todas com a educação e com os hábitos de leitura, as pesquisas apontam que a juventude é a faixa que mais lê. ---"O que a gente precisa entender é o que eles querem ler, é ouvi-los, entender seus gostos, o que conecta com eles. Fazer a aproximação. Abrir o diálogo. Eles sabem o que querem
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Mesmo que este dado seja também por conta do vínculo com a escola, é inegável ver as filas nas bienais, o diálogo deles com os seus autores preferidos na internet. Eles estão muito abertos a se transformar pelos livros e se transformam. Muita gente ainda carrega aquela ideia de que o jovem não lê, que existe esta distância. Eu não acredito, de verdade. Às vezes, ficamos lá só dizendo o que eles devem ler, o que é bom. Será que este é o caminho? O que a gente precisa entender é o que eles querem ler, é ouvi-los, entender seus gostos, o que conecta com eles. Fazer a aproximação. Abrir o diálogo. Eles sabem o que querem. BB: Para pais e professores: que dicas você daria para escolherem um acervo para os jovens leitores da casa ou da classe? Caio: Repetindo a resposta anterior, acho que o caminho é a escuta e o diálogo. Entender, sem qualquer preconceito, o que esse leitor deseja ler.A leitura é generosa: transforma e inspira os leitores. Imagem: Super-Ulisses, de Caio Tozzi (texto) e Renato Drigues (ilustrações)
Eu mesmo já conheci bibliotecas em empresa de motoboy, em oficina mecânica, em padaria. Não é demais? O livro deve estar em todos os lugares, para todo mundo
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Este foi o ponto de partida para criar a história da Albertina, essa menina apaixonada pelos livros, que acaba vivendo a experiência de leva-los até as pessoas através da criação de uma biblioteca móvel. BB: Por que escolheu o nome Ulisses? Esse é um nome significativo na literatura, pois é o personagem principal da Odisseia, uma das obras mais importantes do cânone ocidental, poema grego que tem alguns milhares de anos. Também nomeou outras obras e até o cachorro mais querido de uma das nossas maiores romancistas, a Clarice Lispector... Caio: Olha, essas coisas não têm muita explicação. Eu gosto muito de nomes: tenho um caderninho com nomes sonoros que escuto pelas ruas, vejo nos lugares, [e vou anotando] para batizar meus personagens. Vou muito pelo som; às vezes transformo sobrenomes em nomes (como, por exemplo, o personagem Molina, que é sobrenome de uma amiga bibliotecária muito querida!). E gosto destes nomes como títulos dos livros - é só ver meus livros, a maioria são assim: Tito Bang!, Fabulosa Mani, Procura-se Zapata... Talvez seja uma inspiração nas revistas em quadrinhos, que na maioria das vezes são batizadas pelo nome do personagem principal. Neste caso, queria que o título fosse o nome desta caminhonete, que é a biblioteca móvel, a grande estrela da história. E ela tinha que ter um nome poderoso: “Mega” alguma coisa.. “Super” algo... Surgiu o Super-Ulisses. Mas, confesso que de imediato não fiz conexão nenhuma com qualquer outra obra. Só depois lembrei de tantos Ulisses que existiam no universo literário, como os que você citou, e achei que o nome acabou fazendo muito sentido.///
Super-Ulisses
Autor: Caio Tozzi
Ilustrador: Renato Drigues
Temas: Literatura / Relações
Faixa Etária: A partir de 9 anos
R$ 44,90
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E você? Conhece alguma biblioteca itinerante?